A China foi, nas últimas décadas, consistentemente um dos maiores motores da economia mundial e algumas das suas empresas tornaram-se referência nos respetivos setores. Nos últimos anos, a China tornou-se o maior exportador e o segundo maior país importador do mundo (atrás apenas dos EUA) e contribuiu com cerca de 1/3 para o crescimento global, ou seja, individualmente, apresentou uma contribuição superior à contribuição conjunta dos EUA, da zona do euro e do Japão, assumindo um papel de liderança no crescimento da economia mundial.

 

Os mercados financeiros chineses também registaram, nos últimos anos, importantes avanços assumindo também eles um papel cada vez mais relevante no contexto mundial. Com a decisão de aumento da exposição ao MSCI Emerging Markets Index das ações de classe A chinesas e intenções do governo para abrir cada vez mais o mercado de ações da China a investidores estrangeiros, importa refletir sobre os riscos (contexto de alguma incerteza face ao rumo da economia global e de uma prolongada guerra comercial com os EUA) e oportunidades no mercado acionista chinês.

 

O que são as ações de classe A da China?

 

As ações da categoria A dizem respeito a empresas do mercado doméstico chinesas cotadas no Shangai Stock Exchange (SSE) e na Shenzen Stock Exchange (SZSE) que inclui o Shenzen ChiNext (um índice tecnológico). Estas ações são denominadas na moeda chinesa: o renmibi (RMB). O mercado acionista chinês incorpora uma grande multiplicidade de tipologia de ações, porém o segmento de empresas de classe A representa a maior proporção do mercado total.

 

O mercado acionista chinês:

 

Classe Moeda Mercado Descrição
A RMB Onshore Ações de empresas domésticas e cotadas nas bolsas de Xangai e Shenzen.
B USD e HKD Onshore Empresas chinesas cotadas em Shangai em dólares americanos ou na bolsa de Shenzen em dólares de HKD.
H HKD Offshore Ações de empresas incorporadas na China e listadas na bolsa de valores de Hong Kong
N USD Offshore Ações de empresas incorporadas na China, mas listadas em NYSE
Red-Chips HKD Offshore Ações de empresas controladas pelo estado sediadas fora da China e listadas em Hong Kong
P-Chips HKD Offshore Ações de empresas privadas sediadas fora da China e listadas em Hong Kong

 

 

China a Abril de 2019

 

 

Por imposição regulatória, as ações da classe A cotadas em RMB eram, até 2003, de exclusivo acesso aos investidores domésticos, ou seja, o investimento nestas ações estava totalmente vedado a investidores estrangeiros. Os investidores que pretendessem aceder ao mercado chinês estavam restringidos às ações cotadas na bolsa de valores de Hong Kong e denominadas em dólares de Hong Kong (HKD) ou em USD. Após 2003 a criação de programas de acesso a investidores institucionais qualificados (QFII), permitiu a entrada de investimento estrangeiro. Todavia, as restrições continuavam a ser bastante rígidas em termos de mínimo de investimento, período de lock-up e impossibilidade de repatriamento de capitais e ainda um limite máximo de 20% da capitalização de cada empresa podia ficar na mão de investidores estrangeiros. Posteriormente em 2016, os requisitos foram revistos pela China’s State Administration of Foreign Exchange’s (SAFE). Também foram criados programas que permitiam que ações das bolsas de Shenzen e Xangai fossem transacionadas em Hong Kong (Stock Connect programs).

 

Assim, a maior acessibilidade ao mercado da China de classe A, através da expansão de novos programas, a diminuição do número de suspensões de trading e a revisão dos requisitos de pré-aprovação para veículos de investimento indexados (ETF’s) foram fatores decisivos para, em 2017, a MSCI anunciar a introdução gradual nos seus índices destas ações. Neste sentido, em 2018 os índices MSCI passaram a incluir 5% de ações domésticas chinesas.

 

Já recentemente, em 2019, e de acordo com o que já estava telegrafado nos mercados há algum tempo, o MSCI anunciou que irá quadruplicar o peso das ações de classe A nos seus índices globais, alterando o “fator de inclusão” de ações chinesas em seus índices, de 5% para 20% num processo que será implementado em três fases, com incrementos de 5%, entre maio e agosto e deste ano e, por fim, em maio de 2020. Nas primeiras fases serão incluídas empresas da grande capitalização e, no terceiro passo, serão incluídas as empresas de média capitalização. Findo o processo, as ações de classe A chinesas irão perfazer um total de  cerca de 20% do índice mundial de ações do MSCI e, no final do processo teremos:

 

 

Neste sentido, por exemplo, o peso destas ações no MSCI Emerging Markets será aumentado gradualmente dos atuais 0.7%/0.8% para 3.4%.

 

China a Abril de 2019

 

Quais as implicações no mercado de ações A nos índices MSCI para os investidores?

 

É impossível prever, com exatidão, o impacto desta mudança. No entanto, é certo que este processo está repleto de novas oportunidades de investimento no mercado global e, ao mesmo tempo, um grande avanço para a economia Chinesa, apesar do enorme desafio para as economias concorrentes emergentes.

 

A inclusão de ações chinesas A nos índices globais MSCI é um importante passo para a abertura do mercado doméstico chinês à economia internacional. Este processo está a ser direcionado com algum cuidado e conservadorismo o que é percetível pela decisão de aumento gradual e faseado da exposição nos índices globais do MSCI. Até porque, no que diz respeito às economias emergentes, uma abertura instantânea poderia revelar-se negativa para os países concorrentes que iriam ver o peso das suas economias a reduzir-se drasticamente. Aliás, uma inclusão de 100% das ações de classe A, significaria uma exposição de 15% a 20% no índice acionista emergente, o que diminuiria fortemente o peso de economias como Taiwan, India e Coreia, por exemplo.

 

Apesar de toda a vaga de entusiasmo é preciso ter atenção aos riscos inerentes a este segmento, praticamente inexplorado pelo estrangeiro, e ao nível de desconhecimento das dinâmicas internas dos investidores domésticos.

 

Esta inclusão oferece oportunidades bastante atrativas aos investidores, não só pela sua amplitude e liquidez do mercado, mas pela maior diversidade de indústrias que agregam quando comparado com a bolsa de valores de Hong Kong, que se encontra algo concentrada em empresas de IT e financeiras, oferecendo, por isso, uma ótima oportunidade de diversificação aos portfólios de investimento.

 

O maior risco é certamente o facto de existirem poucos investidores institucionais no mercado, sendo que mais de metade dos investidores são de retalho, de baixa escolaridade, que seguem uma abordagem de “lotaria” / “jogo” em detrimento de decisões racionais. Esta situação, traduz-se inevitavelmente num mercado mais imprevisível, menos eficiente e muito mais volátil.

 

Neste contexto, os gestores ativos podem encontrar oportunidades interessantes neste mercado menos sofisticado e mais ineficiente, mas incorrendo quase inevitavelmente em grandes níveis de volatilidade. No que toca o mercado doméstico, o maior fluxo de investimento estrangeiro pode induzir, a prazo, uma maior disciplina nos investidores locais.