Pela primeira vez desde o fim da Presidência Clinton em janeiro de 2001, o partido Democrata controla o poder executivo (a Presidência) e o poder Legislativo: o Congresso (dominando ambas as câmaras deste órgão: o Senado e a Câmara dos Representantes).
Esta “onda azul” começou a desenhar-se em novembro com a vitória de Joe Biden e Kamala Harris sobre Donald Trump e Mike Pence na corrida à Casa Branca, à Presidencia. Mas o processo eleitoral de 2020 só terminou, já em janeiro de 2021, com a eleição de dois senadores pelo estado da Geórgia uma vez que nenhum dos candidatos conseguiu reunir a maioria dos votos em novembro o que obrigou a uma segunda volta.
Numa disputa muito renhida, os democratas Raphael Warnock (à esquerda na imagem) e Jon Ossoff (à direita na imagem) venceram os seus rivais republicanos Kelly Loeffler e David Perdue.
O Senado (constituído por 100 lugares no total, elegendo-se dois senadores por estado) contará agora com 50 senadores republicanos frente a 48 democratas e dois independentes (próximos do Partido Democrata), ou seja, temos efetivamente um empate de 50 contra 50 nesta Câmara. Neste caso, como acontece sempre que há um empate no Senado, quem será chamada a votar é a vice-Presidente eleita, Kamala Harris, o que levará invariavelmente, em caso de empate nas votações, a uma decisão favorável aos Democratas. Importa apenas recordar que na Casa dos Representantes, onde os congressistas são eleitos em proporção da população do respetivo estado, o resultado das eleições de novembro ditou a manutenção de uma maioria democrata de 222 contra 211, embora mais “curta” do que até agora (os Democratas perderam 9 lugares).
Quais as consequências de uma “Blue Wave”?
Na prática, ao ganhar “o controle” do Senado, os Democratas aumentaram de forma significativa as possibilidades de implementar a sua agenda eleitoral. Biden tem agora uma oportunidade única de concretizar as promessas reformistas em vários planos: económico, social e político.
- A nível económico, esperam-se agora grandes medidas de estímulo fiscal, com o objetivo de combater a crise provocada pela pandemia do Covid 19. A Administração Biden poderá aprovar no Congresso e implementar o seu programa de campanha “Build Back Better”, focado não apenas em estradas e pontes, mas também na rede nacional de banda larga, tecnologias, energia verde e investimento na educação.
- No plano social, os EUA são hoje uma nação profundamente dividida e radicalizada, sendo que Biden terá aqui o grande desafio de voltar a unir os norte-americanos. Esperam-se mudanças nas políticas migratórias, revertendo-se algumas das medidas implementadas por Trump. Também no domínio da saúde teremos certamente alterações, com destaque para o Affordable Care Act (ACA), uma grande prioridade democrata.
- No campo das relações internacionais, espera-se a implementação de uma agenda “verde” e menos isolacionista, sendo expectável um pedido de readmissão dos EUA aos Acordos de Paris e à Organização Mundial de Saúde e uma reaproximação aos países aliados tradicionais e à NATO. Já a relação com a Coreia do Norte, China, a Venezuela e com o Médio Oriente irão continuar a representar grandes desafios para a administração Biden.
- Por fim, a nível bolsista, apesar de tipicamente se associar um candidato democrata a uma performance bolsista pior em termos relativos face a um republicano, tal não é validado pela realidade desde o final da Segunda Guerra Mundial (ver tabela abaixo) e o momento presente é também disso um bom exemplo, com o mercado a registar um desempenho muito positivo nos dois últimos meses de 2020!
Com o controlo simultâneo da Presidência, do Senado e da Câmara dos Representantes, o partido Democrata terá agora a vida mais facilitada, contudo, não é razoável assumir que os próximos anos serão “um passeio” para a nova administração de Biden. Recorde-se que, no sistema eleitoral americano, os membros do Senado e da Câmara dos Representante não são eleitos todos simultaneamente pelo que realizam-se eleições a cada dois anos para parte dos mandatos! Ou seja, o atual domínio pode ser já posto em causa nas eleições de novembro de 2022, a meio do mandato de Biden! Espera-se ainda uma renovada oposição do partido republicano numa era pós-Trump e, por outro lado, o sistema bipartidário americano implica que existam várias fações e linhas de pensamento muito distintas dentro quer do partido Democrata quer do partido Republicano. Assim, Biden também poderá ter de enfrentar oposição dentro do partido Democrata!
A pandemia, o desemprego, a necessidade de recuperação da economia, o desequilíbrio das contas públicas, o lugar de única superpotência dos EUA posto em causa no contexto internacional e um país dividido e polarizado… Os desafios desta Administração para os próximos 4 anos são gigantescos! Veremos se Biden os conseguirá superar.