Após um primeiro debate marcado pelo caos e constante troca de acusações e insultos entre os candidatos e um segundo debate que acabou por não se realizar devido a Trump ter contraído Covid, existia uma grande expectativa relativamente ao terceiro e último dos debates televisivos previstos entre os dois candidatos às Presidenciais dos EUA.
Devido às incidências do primeiro debate, que foi até classificado por muitos analistas políticos como “o pior” debate da história, tiveram de ser adotadas algumas alterações no formato do evento, de forma a garantir que fosse possível, a ambos os candidatos, transmitir as suas ideias sem serem constantemente interrompidos pelo adversário, tendo atribuído ao moderador um “botão silenciador”. E efetivamente as alterações tiveram sucesso e, desta forma, o povo americano foi presenteado com uma discussão mais civilizada na forma, embora não muito diferente na substância, com ambos os candidatos a limitarem-se a recalcar as ideias que já vêm sido transmitidas durante as suas campanhas e as mesmas trocas de acusações foram repetidas até à exaustão.
Os principais tópicos abordados foram, mais uma vez: a luta contra o novo coronavírus, a interferência externa e segurança das eleições, o sistema de saúde, a imigração, o salário mínimo, o racismo e as alterações climáticas.
O debate começou com o Presidente Trump a defender a sua atuação e estratégia de combate à pandemia, argumentando que é imperativo não voltar a fechar o país e defendendo que a alta mortalidade que os EUA estão a viver, é um problema mundial. O Presidente aproveitou também para voltar a anunciar que uma vacina estará pronta dentro de semanas, tendo os militares já preparados para distribuir a mesma o mais rápido possível. No entanto, após algumas perguntas da moderadora, o chefe de estado referiu que não é uma garantia. Por outro lado, Biden utilizou a expressão “inverno negro” (dark winter) para caracterizar os meses difíceis que estarão pela frente com as típicas vagas de gripe a aumentarem ainda mais a pressão sobre os serviços de saúde do país. Apontou também que há uma grande probabilidade de a vacina só ficar disponível, para a generalidade da população, em meados do próximo ano, criticando o Presidente pela sua falta de um plano adequado de combate, levando a um elevado número de mortes.
A discussão foi muito acesa no segundo tópico relativo à possível interferência da Rússia e do Irão nas eleições norte-americanas. Trump voltou a martelar na ideia de que Joe Biden tem ligações à Rússia tendo o seu filho alegadamente recebido USD 3.5 milhões de Moscovo, capitalizando das alegações de corrupção que têm circulado nas notícias, que referem que Joe Biden e o seu filho Hunter tinham um alegado esquema para lucrar com o cargo de vice-Presidente que Joe desempenhava. Biden contra-atacou, referindo que o advogado de Trump, Rudy Giuliani, estava a ser utilizado pela Rússia para espalhar desinformação, já que Rudy foi a origem das histórias que, alegadamente, utilizam informações retiradas do portátil de Hunter que provam indícios de corrupção. Aproveitou a sua intervenção para anunciar que qualquer país que interfira com a soberania dos EUA irá pagar um preço, se for eleito. Biden aproveitou também para dizer que nunca recebeu dinheiro de nenhuma fonte estrangeira, e fez questão de introduzir o tema dos impostos que Trump, alegadamente, pagou um valor insignificante nos EUA, mas um montante muito maior na China onde tinha uma conta bancária. Trump referiu que tem contas em muitos países e que a conta em questão foi criada porque ele estava a equacionar realizar alguns negócios no país, mas acabou por desistir da ideia. Frisou também que a situação ocorreu em 2013, e a conta em questão foi encerrada em 2015, antes de concorrer para a presidência.
O terceiro tema foi relativo ao sistema de saúde. Aqui os candidatos não revelaram nenhuma ideia nova, tendo Trump defendido a sua atuação ao tentar eliminar o Affordable Care Act (Obamacare) argumentando que este sistema não serve os interesses dos americanos, prometendo criar um programa que permitirá melhores planos de saúde com custos mais baixos. Referiu também várias vezes que o seu adversário estava a tentar nacionalizar o sistema de saúde, como vários membros do seu partido têm defendido há muito tempo. Já Biden, quer expandir o Obamacare e adicionar uma opção pública de baixo custo, atacando Trump por querer eliminar o seguro de saúde a muitas famílias carenciadas.
A discussão fluiu para o tema do salário mínimo, tendo Biden defendido os USD 15 / hora, como valor mínimo aceitável como salário digno, referindo que, apesar das dificuldades que a pandemia está a causar à economia e mais precisamente às pequenas e médias empresas, esta conseguiriam suportar esta subida. Já Trump diz que não está contra os USD 15 / hora como salário mínimo, mas remete para cada Estado a autonomia para definir se faz sentido caso a caso.
O tópico seguinte foi relativo à imigração, onde ambos os candidatos trocaram acusações relativas às cerca de quinhentas crianças que foram separadas das suas famílias na fronteira, como forma de desincentivo à imigração ilegal utilizada pela administração Trump, mas agora as autoridades não conseguem localizar os seus pais. Biden refere que esta prática viola os valores da nação e é criminal. Trump defende-se com o argumento de que muitas crianças foram transportadas clandestinamente por carteis. Refere também que as jaulas utilizadas para manter as crianças foram construídas no tempo em que Biden era vice-Presidente.
O tema do racismo foi focado pela moderadora. Trump referiu várias vezes que nenhum Presidente fez mais pelas comunidades negras e hispânicas do que ele, com a possível exceção de Abraham Lincoln. Aproveitou a oportunidade para relembrar a participação de Joe Biden numa lei que culminou no encarceramento de muitos jovens negros apanhados com pequenas quantidades de drogas na sua posse. Biden admitiu o erro e disse que está a fazer os possíveis para o corrigir, referindo que ninguém deve ser preso por ter um problema de drogas ou álcool.
O tema que conclui o debate foi o das alterações climáticas. Trump voltou a referir que defende um ar limpo e águas cristalinas, mas não está disposto a sacrificar a economia para o conseguir. Biden quer voltar ao Acordo de Paris e investir em energias renováveis, anunciando que quer fazer uma transição energética retirando todos os subsídios federais ao setor petrolífero, canalizando os fundos para a energias renováveis.
Nas declarações finais Biden anunciou que, se for eleito, vai basear as suas decisões na ciência e não em ficção, transmitindo esperança para o futuro do país. Já Trump concluiu a sua intervenção dizendo que, caso Biden ganhe as eleições, haverá um aumento dos impostos e que o país entrará numa depressão nunca vista. O Presidente americano tentou ainda ligar Joe Biden à imagem de um político corrupto que promete várias medidas, mas depois falha na execução, enquanto que ele, como um homem de negócios, foca-se em apresentar resultados, procurando voltar a capitalizar numa das ideias que contribuiu para a sua eleição em 2016.
É pouco crível que este debate tenha sido um game-changer e que qualquer dos candidatos tenha sido capaz de influenciar a decisão dos eleitores norte-americanos já que as ideias apresentadas não foram novas.
Note-se ainda que, no momento do debate, mais de 49 milhões de americanos já votaram recorrendo ao voto por correspondência ou ao pre-voto presencial! Um número incrível (correspondente a quase 36% do número de votantes totais nas eleições presenciais de 2016!), o que é justificado pelo receio das longas filas no dia 3 de novembro, em plena pandemia.
As sondagens continuam a favorecer a vitoria do candidato democrata, mas esta situação parece muito semelhante ao que aconteceu em 2016 e que culminou com a eleição algo surpreendente de Donald Trump!