Os mercados financeiros são caracterizados por momentos de enorme exuberância (bull market) e por momentos depressivos (bear market).
Analisando os Bull Markets desde da segunda guerra mundial:
É impossível prever quando vai ocorrer o próximo “bear market”, o que sabemos é que os bull markets “não morrem de velhice”. Historicamente, ou morrem de algum evento extremo, ou na maioria das vezes, terminam devido a uma euforia generalizada dos investidores (preços insustentáveis).
Os bull market evoluem e desenrolam-se ao escalar uma parede de preocupação, o que se tem verificado no ciclo atual. No entanto, o fim do bull market é inevitável, acabaremos por entrar num bear market.
Bear market 2000-2002 (“Bolha da Internet”)
O auge do mercado ocorreu no dia 10 de março de 2000. O S&P 500 tinha multiplicado por mais de 5x em apenas 10 anos. Esta performance dos mercados criou a sensação que era fácil ganhar dinheiro, e que os mercados só podem subir (o que no muito longo-prazo tem sido verdade).
No bull market dos anos 90, sobretudo nos últimos anos, tivemos um fenómeno conhecido como a “Bolha da Internet”, onde qualquer empresa “.com” obtinha um enorme interesse por parte dos investidores. Mudar o nome da empresa para algo associado à Internet aumentava de imediato o valor da empresa, nesse período os investidores abandonaram as métricas tradicionais, como o PER em favor de tudo o que era “.com”. O futuro era internet e todos os outros negócios estavam ou estariam obsoletos.
O que motivou tal exuberância? Não existe uma resposta absoluta, no entanto, podemos afirmar que as baixas taxas de juro (98-99) alimentaram a continuação do bull market.
O que destruiu o bull market? Mais uma vez, não existe uma resposta única, mas as 6 subidas por parte da FED, o arrefecimento da economia e alguns resultados desanimadores destruíram a febre pelas tecnológicas o que levou ao fim desse bull market.
Exemplos da bolha da Internet:
Broadcast.com – Adquirida por 5.9 mil milhões, hoje não existe
O Yahoo era a Google daquele tempo – a empresa mais admirada da internet. Comprou a Broadcast.com, um site de vídeos, por um valor inacreditável, mais de USD 5 mil milhões. Em valores de hoje, isso dá mais de USD 7 mil milhões – ou 4,5 vezes o que o Google pagou pelo YouTube. O Broadcast passado apenas 2 anos estava encerrada. Foi só mais uma da série de péssimas aquisições da Yahoo. Foi com a venda da Broadcast à Yahoo que o famoso investidor Mark Cuban ficou milionário.
The Learning Company – 3.5 mil milhões para 27 milhões
Esta empresa detida em parte pelo investidor Kevin O'Leary (outro “tubarão”) foi adquirida pela Mattel em 1999 por USD 3,5 mil milhões, sendo que em 2000 (cerca de 1 ano depois) foi vendida por USD 27,3 milhões. Ou seja, a Mattel perdeu 99.2% do capital investido.
e.Digital Corporation – valoriza mais 4500% em menos de 1 ano após alteração do nome
A empresa OTCBB fundada em 1988, anteriormente chamada Norris Communications. Em janeiro de 1999, as ações estavam cotadas a USD 0,06. No mesmo mês, após mudar o nome para e.Digital, as ações subiram rapidamente para os USD 2,91 em 31 de dezembro de 1999, sendo que no máximo chegou a estar cotada a USD 24,50 em 24 de janeiro de 2000 (multiplicou por 408x o seu valor). Com o fim da bolha da Internet esta empresa voltou rapidamente a ser cotada a valer cêntimos. Em 2013, as ações continuam em valores baixos, entre USD 0,12 e os USD 0,19.
Como se comportaram os melhores investidores neste ambiente? Onde o mercado avaliava empresas que nunca geram lucro por biliões de dólares e diligenciava as empresas tradicionais que de forma sistemática obtinham lucros? Nesse período vários investidores de enorme qualidade e com provas dadas foram dados como “mortos”, incapaz de se adaptar ao novo mundo. Em 1999 a Berkshire Hathaway (holding gerida pelo Buffett) apresentou uma performance de -19.9%, enquanto que o S&P 500 valorizou no mesmo período 21%. Ou seja, em 1999 o melhor investidor de todos os tempos teve uma underperformance superior a 40 pontos percentuais, vários comentadores apressaram-se a garantir que a forma que o Buffett utilizava para investir já não resultava, vivíamos um novo tempo, onde avaliar o “valor real” de uma empresa já não era relevante.
No auge da bolha da internet, Buffett alertou os investidores que os preços das empresas tecnológicas estavam demasiado elevados, “Investors in stocks these days are expecting far too much ", estes preços só seriam justificáveis num cenário de elevado sucesso destas empresas.
Em julho de 1998 na conferência anual de Sun Valley da Allen & Co, Buffett argumentou que muitas pessoas acreditam que as fortes valorizações das ações desde 1981 iam continuar pelos menos mais 17 anos, algo que seria muito pouco provável. Como o Buffett referiu, não é realista pensar que os lucros das empresas e a própria economia iriam sustentar expetativas tão elevadas do mercado. Apesar de concordar que a internet iria mudar o mundo.
Em suma, a bolha tecnológica ensina-nos que em qualquer cenário, as métricas financeiras são relevantes, e que quando o mercado tem expetativas muito elevadas sobre a evolução futura de um negócio, é muito provável que o mercado fique frustrado com a realidade.
No presente temos algumas situações parecidas com a bolha da internet, seja a enorme valorização da Bitcoin ou valorização das empresas de comércio online (Amazon, Farfetch), ou ainda, a enorme valorização das empresas associadas a uma nova tecnologia, como é o caso da UBER, que apesar de nunca ter dado lucro vale tanto quanto a Volkswagen AG (que é o maior grupo automóvel do mundo).
Temos que ter sempre em mente, que o sucesso de qualquer investimento está intrinsecamente ligado ao preço a que o adquirimos. O preço conta.